quinta-feira, 25 de abril de 2024

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Que a Liberdade está a passar por aqui...

João Andarilho 

 QUANDO VIERES




Quando vieres

Encontrarás tudo como quando partiste.
A mãe bordará a um canto da sala...
Apenas os cabelos mais brancos
E o olhar mais cansado.
O pai fumará o cigarro depois do jantar
E lerá o jornal.
Quando vieres
Só não encontrarás aquela menina de saias curtas
E cabelos entrançados
Que deixaste um dia.
Mas os meus filhos brincarão nos teus joelhos
Como se te tivessem sempre conhecido.
Quando vieres
nenhum de nós dirá nada
mas a mãe largará o bordado
o pai largará o jornal
as crianças os brinquedos
e abriremos para ti os nossos corações.
Pois quando tu vieres
Não és só tu que vens
É todo um mundo novo que despontará lá fora.

«Maria Eugénia Cunhal» - In «Silêncio de Vidro»

domingo, 21 de abril de 2024

 THE POSTMAN ALWAYS RINGS TWICE


Johanna e Johannis formaram um casal que viveu num casal no povoal de Taxoval algures no Portugal da década de 90 do séc XIX. Oriundos do norte da Europa, arribaram ao nosso país de forma dramática, quando, numa noite de tempestade, o veleiro que os transportava em direcção à Terra Nova, se aproximou perigosamente da costa naufragando ao norte da península de Peniche, junto à Nau dos corvos, no Cabo Carvoeiro. Foram dos poucos sobreviventes e acabaram por descobrir terra nova numa terra completamente desconhecida e estranha. Sem recursos que não a força de vontade e dois pares de braços, retomaram a sua vida não muito longe do local do naufrágio, em terras da Lourinhã, não sem que antes tenham permanecido alojados, temporariamente, na aldeia de Ferrel, com a ajuda do capelão. Porém, a estadia foi breve, até porque, naquelas paragens, tudo o que não seja da terra dos burros é olhado com desconfiança. Com esforço, em Taxoval de Baixo, construíram uma pequena habitação com os recursos que tinham à mão. Era pequena, mas suficientemente acolhedora para lhes dar o conforto que o desconforto dos elementos provocava. Os anos passaram e o casal assentou raízes, constituindo uma prol de descendentes que o tempo se encarregou de dispersar. Todavia, algum, certamente, tri-neto possivelmente, tem tentado reescrever a estória familiar e recuperar aquilo que foi património dos seus trisavós. 

Podia ser assim o enredo que imaginei para a absurda visão que se depara ao viajante que percorre uma estreita estrada secundária do Taxoval de Baixo. Mesmo em frente a umas majestosas ruinas daquilo que foi uma habitação e à entrada do terreno onde estão situadas, alguém plantou um moderno e bonito poste com caixa de correio e número de porta. É um postal surreal e dá liberdade à imaginação... 

Uma coisa deve ser certa: não está fácil ao tri-neto, a legalização daquilo que foi património dos seus ascendentes, imagino eu 🫣




João Andarilho 

  SÃO JOÃO   "23.6 À meia noite de hoje (ontem) acendem-se os fogos. A multidão reúne-se em redor das altas fogueiras. Nesta noite limp...