sábado, 11 de setembro de 2021

11-9-1973

ÚLTIMO POEMA DE VICTOR JARA (completo)




Somos cinco mil

nesta pequena parte da cidade.

Somos cinco mil.

Quantos seremos no total,

nas cidades e em todo o país?

Somente aqui, dez mil mãos que semeiam

e fazem andar as fábricas.



Quanta humanidade

com fome, frio, pânico, dor,

pressão moral, terror e loucura!



Seis de nós se perderam

no espaço das estrelas.



Um morto, um espancado como jamais imaginei

que se pudesse espancar um ser humano.



O outros quatro quiseram livrar-se de todos os temores

um saltando no vazio,

outro batendo a cabeça contra o muro,

mas todos com o olhar fixo da morte.



Que espanto causa o rosto do fascismo!



Colocam em prática seus planos com precisão arteira,

sem que nada lhes importe.



O sangue, para eles, são medalhas.



A matança é acto de heroísmo.



É este o mundo que criaste, meu Deus?

Para isto os teus sete dias de assombro e trabalho?



Nestas quatro muralhas só existe um número

que não cresce,

que lentamente quererá mais morte.



Mas prontamente me golpeia a consciência

e vejo esta maré sem pulsar,

mas com o pulsar das máquinas

e os militares mostrando seu rosto de parteira,

cheio de doçura.



E o México, Cuba e o mundo?




Que gritem esta ignomínia!

Somos dez mil mãos a menos

que não produzem.



Quantos somos em toda a pátria?



O sangue do companheiro Presidente

golpeia mais forte que bombas e metralhas.



Assim golpeará nosso punho novamente.


Como me sai mal o canto

quando tenho que cantar o espanto!



Espanto como o que vivo

como o que morro, espanto.



De ver-me entre tantos e tantos

momentos do infinito

em que o silêncio e o grito

são as metas deste canto.



O que vejo nunca vi,

o que tenho sentido e o que sinto

fará brotar o momento...”



(Victor Jara, Estádio do Chile, Setembro 1973).

Sem comentários:

Enviar um comentário

  SÃO JOÃO   "23.6 À meia noite de hoje (ontem) acendem-se os fogos. A multidão reúne-se em redor das altas fogueiras. Nesta noite limp...