O QUASE PADRE
Déspota, criminoso, António de Oliveira Salazar, ex: seminarista, ex: professor catedrático na Universidade de Coimbra, ex: deputado, ex: ministro das finanças, Ditador, Fascista.
Porquê falar do fascismo e de fascistas. Porque está na moda por essa Europa fora e pelo mundo a eleição de representantes desse género de ideologia. Felizmente as modas tardam a chegar a Portugal. Sempre fomos um país avesso ao progresso.
Daí um breve retrato do regime e do facínora para que a memória não esmoreça.
Tomo a liberdade de transcrever pequenos trechos inclusos na obra "Portugal A Flor e a Foice" do escritor, cronista e professor de literatura portuguesa, J. Rentes de Carvalho.
《Deputado católico por um dia, em 1921, ministro das finanças durante uma semana, em 1926, Salazar veio para ficar e anuncia-o secamente no seu discurso de posse “ sei muito bem o que quero e para onde vou, mas não se me exija que chegue ao fim em poucos meses. No mais, que o país estude, represente, reclame, discuta, mas que obedeça quando se chegar à hora de mandar.”
Um sacerdote, igualmente catedrático em Coimbra e seu amigo íntimo, Manuel Gonçalves Cerejeira, viria a ser cardeal-patriarca de Lisboa. Com um padre e um quase padre, a Igreja e o Fascismo alicerçam-se no país enfraquecido, vão tomar o seu destino em mãos.
Ao guarda- livros não se pode dar desculpa, mas tem que se lhe dar um crédito: o de exigir que as despesas não ultrapassem as receitas e a submissão absoluta de todos os ministérios ao das finanças. Desse modo, pela terceira vez em setenta e cinco anos, o orçamento do Estado apareceu equilibrado e assim se manteve até que sobre ele caiu o desproporcionado peso da guerra colonial na década de sessenta.
Mas acrescente-se o que os panegeristas sempre passaram por alto e o que os bajuladores nunca quiseram ver: orçamentos equilibrados graças à miséria atroz para quase todos, privilégios desmesurados para um pequeno grupo. Tudo isso em nome de Cristo, da Família e da Ordem e de uma bizarra concepção da sociedade, infelizmente partilhada por mais e exposta pela última vez num discurso do ditador proferido em 1967: “Sempre houve pobres, sempre os há-de haver, é preciso que os haja”.
O Governo, a Assembleia e o funcionalismo relegados ao papel de comparsas. O povo açaimado e conhecendo um atraso e uma miséria medievais. A polícia perseguindo e torturando os oponentes, sobretudo os comunistas que, desde o início, serão os adversários mais consequentes e constantes do regime; Salazar é, na verdadeira acepção, senhor e dono do país. Tal como um soberano, mantém a sua corte de vassalos. Aos favoritos distribui prebendas, mercês e, para melhor os dominar, permite- lhes que roubem impunemente, reservando para si a auréola de incorruptibilidade, de desinteresse material e ascetismo.
A história da corrupção em Portugal entre 1926 e 1974, talvez nunca venha a ser escrita, mas é interessante recordar como o povo a sintetizou numa anedota:
Uma noite jantava Salazar em casa do General Carmona, então presidente da República e à mesa reinava um silêncio profundo. Um dos netos do general, ainda criança, voltando-se para Salazar quis saber:
- Senhor presidente, o que é o governo?
Não tendo recebido resposta, na sua inocência fez mais uma pergunta: - e o que é a ditadura?
Salazar retorquiu irritado: - o menino faça como o avozinho, coma e cale-se. 》.
Destas breves passagens, ironicamente continuamos a sentir na pele a ditadura do Ministério das Finanças e o roubo dos salários dos portugueses em proveito da alta finança, da capitalização dos bancos privados e da expropriação dos recursos públicos a favor dos grandes monopólios economicos. É isto uma democracia?
João Passado dos Carretos
Sem comentários:
Enviar um comentário