sábado, 19 de junho de 2021

 O ANJO


"Não, não era preciso as janelas abertas para o anjo poder entrar. O anjo passava pelas paredes assim como a farinha pela peneira, ou, melhor, assim como os raios de sol pelo vidro. E saía da mesma forma, com as pessoas nos braços, pois assim que as mãos do anjo tocavam nas pessoas também já as pessoas passavam pelas paredes como a farinha pela peneira, ou, melhor, na mesma pelo vidro como os raios do sol. 

Ficavam as pessoas, em tudo, como os anjos, tirante as asas, e só por isso precisavam que as levassem os anjos. Quando o anjo chegava, o dia mais claro parecia noite, comparado à claridade que espalhavam as asas do anjo. E por essa claridade como não havia outra logo se conhecia que chegava o anjo, antes até que chegasse de todo. As asas do anjo, qual de neve! Muitas, muitas mais vezes mais de neve do que a neve. E, mal que o anjo chegava, as pessoas, nem que lhes doesse muito fosse o que fosse, a cabeça, ou uma perna, deixavam já e já de sentir dores. Os olhos do anjo lavavam as dores assim como a água lava um copo. Também, ao chegar um anjo, as pessoas, por mais tristes, passavam a mais alegres do que nunca por nunca. O anjo ria-se para as pessoas e as pessoas riam-se para o anjo, estendiam-lhe os braços. "

Tomaz de Figueiredo in " A Toca do Lobo "



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